Daniel
Barroca
Daniel Barroca
Portugal, 1976
Daniel Barroca (Lisboa, Portugal, 1976) desenvolve a sua prática artística inscrita numa contínua pesquisa acerca das relações dialéticas que as imagens são capazes de criar entre si. Como ponto de partida, o arquivo fotográfico do período em que o seu pai foi combatente na Guiné-Bissau, entre 1972 e 1974, é conciliado com outros arquivos de guerra encontrados pelo artista ao longo dos anos. Através, principalmente, do desenho, da fotografia e do filme, é na ideia de memória coletiva que se configura o seu campo de trabalho.
Num processo que ressignifica as imagens que compõem esses arquivos e que persegue uma visão emancipatória, Daniel Barroca realoca o tema da guerra para lá do seio familiar e da esfera doméstica. O trauma e as presenças fantasmagóricas que habitam o imaginário do assunto são tornados objetos na construção de narrativas e perspetivas que contrastam com a forma dominante como a História é contada e que questionam o seu silenciamento dentro do âmbito público — o qual, apesar de herança do Estado Novo, se manteve após o processo de democratização em Portugal.
Victor Bor (1943(?) – 2023), 2024
Video-instalação com três canais, cor, som, Full HD, loop
Cortesia do artista.
Nesta obra comissionada pela bienal O Fantasma da Liberdade, o artista Daniel Barroca rememora a figura do curandeiro Victor Bor, que conheceu na Guiné-Bissau, em 2016, e com quem manteve contacto até quase à sua morte, em 2023. Iniciado no movimento profético Kyangyang durante os anos de 1980, Victor Bor experienciou uma série de «visões», entre imagens e sons, em sonhos e desperto, que o tornaram apto a praticar curas e a ler almas. Durante as experiências de comunicação com outros planos, o curandeiro dialogava com aquilo que pode ser interpretado tanto como Deus, quanto como os mortos. Desse poder, originou-se também a capacidade de produzir objetos escritos, desenhos-talismãs, os quais utilizava nos seus rituais de cura.
O Kyangyang iniciou-se na Guiné-Bissau recém-independente, por entre a comunidade Balanta, em torno de Ntombikte, uma jovem profetisa que, em 1984, começou a anunciar os mandamentos de Deus. Enquanto movimento profético, desempenhou um papel relevante na reconstrução de uma sociedade desmoralizada e fragilizada, social e politicamente, após a guerra da independência — apesar de, posteriormente, ter sofrido violenta repressão estatal. Criadores de uma rica cultura visual, o movimento e a sua fundadora, Ntombikte, produziram uma vasta série de desenhos, parte dos quais integra uma das projeções da videoinstalação de Daniel Barroca.
Daniel Barroca vive em Lisboa. O seu trabalho já foi exposto em diversas instituições nacionais e internacionais, de entre as quais se destacam: Fundação Serralves, Fundação Calouste Gulbenkian, Centro Internacional das Artes José de Guimarães, Fundação Carmona e Costa, Galeria Municipal do Porto, Arquipélago – Centro de Artes Contemporâneas, Fondation Calouste Gulbenkian Paris, Museu de Arte Contemporânea de Elvas, Galeria Vera Cortês, Fundación Botín, The Smithsonian American Art Museum, Künstlerhaus Bethanien, National Center for Contemporary Art Moscov e The Drawing Center.