Clara
Menéres
Clara Menéres
Portugal, 1943 - 2018
Uma das mais contundentes escultoras portuguesas, Clara Menéres (Braga, Portugal, 1943 – Lisboa, Portugal, 2018) desenvolveu uma obra plural que reflete as suas diversificadas capacidades formais e técnicas. Associada à desconstrução dos cânones da tradição escultórica, a artista produziu trabalhos empregando desde materiais e modos clássicos de produção, como o barro, o gesso, a madeira, a pedra e o bronze, até aos menos habituais, como os têxteis, a cerâmica, as resinas sintéticas moldadas e o vidro — tendo criado obras seminais da arte contemporânea, como a instalação Jaz morto e arrefece o menino de sua mãe, de 1973, que denuncia de forma hiper-realista a guerra colonial, ou Mulher-Terra-Viva, de 1977, instalação que dialoga com os pressupostos da land art.
Ao longo das décadas, a obra de Clara Menéres abrangeu temáticas, que, a priori, pareceriam anacrónicas, sob uma prática artística conciliadora e profundamente vinculada a um pensamento filosófico e sociopolítico. Através da exímia habilidade para integrar na escultura as tensões contraditórias da sua complexa natureza, Clara Menéres fez coexistir o erotismo, a religiosidade, os mitos fundadores, as alegorias (principalmente a da morte), as passagens bíblicas, a intervenção cívica e a maternidade. O seu percurso também foi marcado pela colaboração com Joaquim Lima e Alfredo Queiroz Ribeiro na criação do grupo ACRE — coletivo concebido após o 25 de Abril que realizou intervenções artísticas politicamente implicadas.
Relicário, 1969
Escultura em resina sintética e caixa de madeira
Espólio Clara Menéres.
O percurso da obra Relicário, de Clara Menéres, evidencia os mecanismos censórios vigentes em Portugal durante o Estado Novo. Produzido em 1969 e exposto pela primeira vez apenas em 1977, o falo de resina amarela, além de tangenciar questões que lidam com a maneira como a repressão, o erotismo e a sexualidade estão vinculados dentro da sociedade, é um trabalho que se relaciona com a história dos objetos nas artes. Resguardado por uma caixa escura típica dos altares em miniatura, incita uma familiaridade com os objetos do Surrealismo ao sugerir uma deslocação do seu valor semântico. Ao ocupar um espaço perfeitamente cabível à figura de um santo, aciona um certo delírio lúdico. Por essa razão, junto aos outros objetos que ocupam a casa do CAPC Sede ao longo desta bienal, Relicário, de Clara Menéres, surge como um vislumbre das intenções curatoriais por trás de O Fantasma da Liberdade.
O trabalho de Clara Menéres já esteve exposto em diversas instituições nacionais e internacionais, de entre as quais se destacam: Fundação Bienal de São Paulo, Fundação Calouste Gulbenkian, Sociedade Nacional de Belas Artes, Galeria Nacional de Arte Moderna, Museu Nacional Soares dos Reis, Museu Municipal de Tavira, Centre Culturel Portugais e Jadite Gallery. As obras da artista integraram exposições de referência, como Earthkeeping / Earthshaking (2020), Galeria Quadrum, e Alternativa Zero: Tendências Polémicas na Arte Portuguesa Contemporânea (1977).