Luís

Cília

Luís Cília

Angola, 1943

A história da vida e da obra do cantor e compositor Luís Cília (Huambo, Angola, 1943) entrelaça-se com a história dos movimentos políticos de resistência à ditadura salazarista e à Guerra Colonial. Quando, em 1959, vem estudar para Portugal, e, pouco tempo depois, passa a integrar o movimento estudantil, assinala-se o momento de despertar do seu duradouro comprometimento com a transformação política da realidade.

Parte para exílio na Suécia, em 1964, após a instauração de um processo contra si pela PIDE (polícia política do Estado Novo). Antes de chegar ao destino final, acaba por se instalar em Paris, cidade onde entra em contacto com a Associação dos Originários de Portugal, bem como com figuras importantes do meio político, artístico, da resistência, e com alguns conterrâneos também exilados. É esse o contexto que vê surgir um músico profundamente consciente das fragilidades e violências inerentes às sociedades europeias colonizadoras. Engajado na sua denúncia, no mesmo ano que chega à França grava o seu primeiro LP, intitulado Portugal-Angola: Chants de Lutte, pela editora Chant du Monde. As canções de intervenção e os poemas musicados de escritores portugueses compõem a sua extensa obra, marcadamente implicada na efervescência política da sua época. Desde a edição que faz de Contra a Ideia da Violência a Violência da Ideia, em homenagem a Amílcar Cabral, até à sua proximidade e colaboração com o músico espanhol Paco Ibañez, a música de Luís Cília evoca a importância da luta constante pela liberdade dos povos.


Arquivo Luís Cília, 2024

Instalação, materiais e dimensões variáveis

Arquivo do artista.

Foi durante os dez anos que Luís Cília passou exilado que a sua carreira de cantor e compositor ganhou reconhecimento em diversos países, o que o levou a realizar recitais e espetáculos em festivais, comícios e associações estudantis. Para a bienal O Fantasma da Liberdade, é criado, dentro do espaço do Mosteiro de Santa Clara-a-Nova, um protoarquivo que resguarda algumas das memórias das suas apresentações públicas. Esta é uma oportunidade para, além de homenagear a figura de Luís Cília e ressaltar o papel da música na história da resistência, trazer ao público imagens que, por muito tempo, foram mantidas longe do imaginário coletivo sobre o passado colonial de Portugal.

Tais imagens ressuscitam fantasmas que o país trancou atrás de portas muito bem fechadas e que, em certa medida, surgem como um convite à reformulação das narrativas que cercam esse passado, a Guerra Colonial, o 25 de Abril, as independências dos países ex-colónias e a formação da sociedade portuguesa do presente. Nessas histórias, que, ainda hoje, são permeadas por lacunas, a ocupação no Mosteiro de Santa Clara-a-Nova acerca do arquivo de Luís Cília propõe uma oportunidade de reflexão sobre assuntos que permanecem de difícil assimilação.

Composta pela projeção de imagens das suas apresentações na República Democrática Alemã, em 1973; pelos encartes de três dos seus discos lançados, Portugal-Angola: Chants de Lutte (1964), Meu País (1973) e Contra a Ideia da Violência a Violência da Ideia (1973); por fotografias impressas do seu arquivo pessoal; pelo fantasmático assobio da música criada para o filme O Salto, de 1967, do diretor Christian de Chalonge (que traça um retrato dos jovens portugueses emigrados para a França para escapar à Guerra Colonial); e pela letra da canção A Bola, que cada visitante poderá levar para casa, Arquivo Luís Cília é uma proposta para reanimar o espírito revolucionário da sua obra.

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© Jorge das Neves