Túlia
Saldanha
Túlia Saldanha
Portugal, 1930 - 1988
Túlia Saldanha (Macedo de Cavaleiros, Portugal, 1930–1988) iniciou a sua trajetória artística tardiamente, aos 37 anos, quando ingressou numa formação em Pintura pelo Círculo de Artes Plásticas de Coimbra. Ao longo das duas décadas seguintes, o Círculo tornou-se na sua «residência artística» em permanência, um lugar de experimentação, convívio com os pares da sua geração e espaço de desenvolvimento de uma obra cuja intensidade era capaz de dissolver as fronteiras que separam a arte da vida.
Transitando entre linguagens e suportes, Túlia Saldanha estendeu a sua atividade artística ao campo da pintura, da escultura, da performance, da ação e da atividade pedagógica. A sua obra formulou, simultaneamente, uma expressão autobiográfica e um espaço de encontro com o Outro. A passagem do tempo, a subversão dos espaços da feminilidade, a criação coletiva, o seu envolvimento com o ensino das artes e a sua relação com o Círculo são as principais chaves para o entendimento do seu trabalho. A participação da artista nesta bienal relembra o acontecimento que António Barros refere enquanto a «última performance» da artista: um voo em círculo sobre a sede do CAPC — ou uma espécie de retorno a casa.
Sem Título, s/d. (de criação 1976)
Armário-caixa de madeira, pintado a tinta acrílica, com figuras de cerâmica pintadas a tinta esmalte e campânula de vidro
Coleção particular.
Sete figuras de santos de cerâmica são pintadas em tinta esmalte e posicionadas num círculo fechado — apesar de resguardadas por uma campânula e por um armário, em alusão à maneira como essas miniaturas costumam figurar em altares caseiros, as cores vibrantes e a superfície brilhante da tinta acionam um certo delírio sobre os objetos. Em diálogo com outras obras do seu repertório, como Do Nordeste a Coimbra (1978), é manifestada uma postura crítica da artista em relação aos temas que circunscrevem os espaços tradicionalmente femininos. Através de intervenções estéticas, Túlia Saldanha desvirtua os símbolos que compõem o imaginário sobre o quotidiano doméstico. Muito próximo deste trabalho, o Relicário de Clara Menéres, de 1969, estabelece uma conversa profunda entre artistas da mesma geração diante dos valores patriarcais, conservadores e autoritários da sociedade portuguesa da época, no contexto da passagem do Estado Novo para a democracia.
Em 2014, a obra de Túlia Saldanha recebeu a sua primeira exposição antológica, intitulada Túlia Saldanha, no Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, com itinerância no Museu Vostell Malpartida, em 2015. Entre 2020 e 2021, recebeu a retrospetiva Umahora vi, no Centro de Arte Contemporânea Graça Morais. Em vida, participou em diversas exposições e intervenções artísticas organizadas pelo Círculo de Artes Plásticas de Coimbra e por Ernesto de Sousa, de entre as quais se destacam o 1 000 011.º Aniversário da Arte e Arte na Rua (1974), a Semana da Arte (da) na Rua (1976) e Alternativa Zero: Tendências Polémicas na Arte Portuguesa Contemporânea (1977).